domingo, 9 de dezembro de 2012

Sistema Endócrino de Insetos e a Aplicação Deste Conhecimento

  
   O sistema endócrino envolve a secreção de hormônios, definidos como substâncias químicas que atuam como sinalizadores celulares, exercendo suas funções em células alvos distantes do seu local de síntese. Em geral, os hormônios são transportados aos tecidos influenciando uma série de processos fisiológicos, tais como reprodução, comportamento alimentar, digestão, síntese e estoque de carboidratos e lipídios.
   Há dois mecanismos de ação hormonal em todas as células-alvo. Em hormônios não esteróide (solúveis em água) não entram na célula, mas ligam-se a receptores de membrana, gerando um sinal químico (ativando a proteína G) no interior da célula alvo. A proteína G ativar outra proteína que produz AMP cíclico que desencadeia a resposta de células-alvo (figura 1).

Figura 1: A ação de hormônios não esteróide. (Imagens de Purves et al,. vida: a ciência da biologia , 4 ª Edição.    (http://www.cartage.org.lb/en/themes/sciences/lifescience/generalbiology/physiology/endocrinesystem/MechanismsHormone/MechanismsHormone.htm).

   O segundo mecanismo envolve hormônios esteróides, que passam através da membrana plasmática e agem num processo que consiste em dois passos: uma vez dentro da célula, os hormônios esteróides se ligam nos receptores de membrana nuclear, produzindo um ativado complexo hormona-receptor. O ativado complexo hormona-receptor liga-se ao DNA e ativa os genes específicos, aumentando a produção de proteínas (figura 2).

 Figura 2: A ação de hormônios esteróide. (Imagens de Purves et al,. vida: a ciência da biologia , 4 ª Edição.    (http://www.cartage.org.lb/en/themes/sciences/lifescience/generalbiology/physiology/endocrinesystem/MechanismsHormone/MechanismsHormone.htm).

   No corpo do inseto, os hormônios são produzidos por centros neurais, neuroglandulares ou glandulares. Os principais centros endócrinos em um inseto são: as células neurossecretoras (essas células produzem o maior numero de hormônios conhecidos dos insetos, e regula a produção de ecdisteróides e homônios juvenis nas glandulas); corpora cardiacum (esta, armazena e libera neuro-hormônios, inclusive o que estimula a atividade da glândula protorácica, o hormônio protoracicotropico(HPTT) ); glândulas protorácicas (glândula secretora de um ecdisteróide, em geral ecdisona, o qual induz o processo de muda); e corpora allata (sua função é secretar hormônio juvenil (HJ), o qual tem função reguladora tanto na metamorfose quanto na reprodução) (Figura 3). 


Figura 3: Esquema geral de neurosecretores de insetos. (Figura adaptada do livro de GULLAN et al. Os insetos: um resumo de entomologia. 3.ed São Paulo, 2008)
 
   Em insetos, os hormônios mais estudados são os relacionados ao controle do ciclo de vida (quadro 1). Dentre estes, hormônio protoracicotropico, hormônio juvenil e ecdisona são três hormônios que devem estar presentes nos momentos adequados e em quantidades precisas, ao longo do ciclo de vida dos insetos, para que seu desenvolvimento ocorra de forma plena e satisfatória (figura 4).
 

Quadro 1: Hormônios envolvidos na muda e metamorfose de insetos
Hormônio
Fonte – natureza química
Funcão
Ecdisona
PTG- esteroide
Estimula a muda
Hormônio juvenil
Corpora allatum- isopreno
Dirige a metamorfose
Hormônio protoracicotropico
Cérebro – peptídeo
Estimula a biossíntese de ecdisona
Allatotropina
Cérebro – peptídeo
Estimula a biossíntese de HJ
Allatostatina
Cérebro – peptídeo
Inibe a biossíntese de HJ
Hormônio de eclosão
Cérebro – peptídeo
Estimula a eclosão

Figura 4: Representação esquemática da síntese, liberação e ação dos principais neuro-hormonios e hormônios relacionados ao processo de muda de Rhoniud prolixus.

    O hormônio juvenil, liberado pelo corpora allatum, tem papel essencial sobre o desenvolvimento, especialmente sobre a morfogênese, bem como sobre o comportamento e processos reprodutivos dos insetos, tais como desenvolvimento de ovário, produção de vitelogenina e captação desta para dentro do ovócito, acasalamento e oviposição. Muitos dos eventos, morfogênicos ou reprodutivos, dependem de um período específico de liberação do hormônio juvenil. Sabe-se que o hormônio pode ter o nível aumentado pela allatropina ou diminuído pela allatostina, duas famílias de neuropeptídios controladores da atividade do corpora allatum. O controle da produção de hormônio juvenil, como consequência, promove a retenção das características imaturas da larva, inibindo a metamorfose até que se complete o desenvolvimento da larva. Quando a concentração desse hormônio na hemolinfa diminui e desaparece da circulação, a metamorfose que leva ao adulto ocorre.
   A fase terminal do processo de muda nos insetos tem ainda a participação do hormônio protoracicotropico, que  é sintetizado por células neurossecretoras dispostas na região mediana do protocérebro e liberado hemolinfa. Este, estimula a “corpora cardíaca” a secretar ecdisona. A ecdisona é um hormônio esteroide hidroxilado. Nos tecidos periféricos a ecdisona é convertido em 20-hidroxiecdisona, composto capaz de ativar as células hipodérmicas, com a restauração da capacidade de crescimento das mesmas e síntese proteica, permitindo a formação de uma nova cutícula, resultando na liberação da cutícula velha (apólise).


QUAL A APLICAÇÃO DESSES CONHECIMENTOS?

                                                Inseticidas reguladores de crescimento de insetos


   Os insetos são considerados nossos maiores competidores no que diz respeito à alimentação. Nesta disputa o homem tem recorrido ao uso de agrotóxicos, como os compostos organofosforados e clorados. Os organofosforados foram os primeiros praguicidas sintéticas e dominaram o mercado durante o período de 1940 a 1960. Sabe-se que esses compostos atuam por ingestão e/ou contato, interferindo nos canais de Na+  regulado por voltagem alterando o equilíbrio Na+ e K+, impedindo a transmissão nervosa normal, provocando paralisia no inseto seguida de morte. Porém, os altos custos dos inseticidas, riscos de intoxicação durante a aplicação e a possibilidade de ocorrência de partículas residuais nos alimentos, desfavorecem o uso desta prática. 
   A solução para o controle de insetos-pragas está vinculada ao uso de vários métodos compatíveis e racionais. Posteriormente, a indústria química vem investindo na fabricação de “defensores agrícolas” na busca pelo combate de pragas que afetam a produção de alimentos.
   Como já explicado anteriormente, os hormônios de insetos são compostos químicos que circulam na hemolinfa para sinalizarem e regularem as atividades fisiológicas. Alguns compostos químicos apresentam moléculas que podem ser análogas, miméticas ou de ação semelhante aos hormônios. Esses compostos são biologicamente ativos e vem sendo estudados e utilizados como inseticidas. Tais compostos podem atuar como reguladores de crescimento, sendo inibidores da síntese de quitina, juvenóides (agem como agonistas do hormônio juvenil), anti-juvenóides (agem como antagonistas do hormônio juvenil) ou agonistas de ecdisteróides.
   Diversas moléculas análogas ao hormônio juvenil têm sido descobertas, podendo ser utilizadas como inseticidas de baixa toxicidade. O lufenurom, do grupo das benzoilfeniluréias, age como inibidor da síntese de quitina, impedindo a formação do tegumento ainda no embrião. Os Juvenóides ou Neotenina agem prolongando os estágios larvais e de ninfas, e adultos estéreis se desenvolvem, impedindo o crescimento a população de insetos gradualmente irá decair. Esses compostos imitam os hormônios juvenis dos insetos. Inibem a liberação de hormônio protoracicotropico no cérebro, que resultará na não ativação da glândula protorácica que não irá sintetizar e secretar a ecdisona que é o fator indutor da muda.
   A molécula metoxifenozida, do grupo das diacilhidrazinas, possui efeito na reprodução, assim como extratos da árvore nim, Azadirachta indica (Meliaceae), têm sido utilizados para controle de lagartas, fazendo com que os insetos reduzam a alimentação, a reprodução e a longevidade. Tanto a molécula metoxifenozida e de azadiractina causa efeito no ciclo de vida do insetos por causa da  competição por receptores de membrana de ecdisteróides.
   Existem, porém, inseticidas que são altamente tóxicos e por isso seu uso vem sendo restringido e até proibido em alguns casos. Eles possuem elevada estabilidade química, lenta degradação, acumulando-se no meio ambiente e persistindo por longos tempos, são facilmente acumulados nos tecidos animais e vegetais, e, portanto permanecem na cadeia alimentar por longos períodos, são insolúveis em água, mas possuem elevada solubilidade em gordura. Sua atuação se dá sobre o sistema nervoso central, provocando distúrbios sensoriais, da atividade da musculatura involuntária, alterações de comportamento, promovem alterações nas propriedades eletrofisiológicas e enzimáticas da membrana celular nervosa, dentre outros efeitos.
  

DISRUPTORES ENDÓCRINOS – QUE SÃO E SUAS IMPLICAÇÕES

   Além de inseticidas, um grande número de substancias químicas artificiais são colocadas em nosso ambiente, como por exemplo, produtos sintéticos, metais pesados, herbicidas, fungicidas, etc. Estes, afetam, as vezes de maneiras drásticas, os processos fisiológicos dos animais, e muitas vezes se acumula lençóis freáticos, mananciais de água para abastecimento público. Dentre esses agentes temos os disruptores endócrinos.
   Disruptores endócrinos são agentes e substâncias químicas ou artificiais exógenas que agem como hormônios naturais no sistema endócrino e causam alterações na função fisiológica dos hormônios endógenos. Podem agir por mecanismos fisiológicos pelos quais substituem os hormônios do nosso corpo, ou bloqueiam a sua ação natural, ou ainda, aumentando ou diminuindo a quantidade original de hormônios, alterando as funções endócrinas (SANTAMARTA, 2001).
   Algumas moléculas químicas artificiais possuem receptores que são reconhecidos pelo sistema endócrino, podendo assim ser identificadas por ele como os hormônios endógenos. Uma vez reconhecidos, passam a alterar a rota bioquímica dos hormônios verdadeiros, os tornando inativos e tomando seu lugar. O organismo dos animais e está subordinado a uma cascata de eventos, complexos, integrados e concatenados, dos quais a liberação de hormônios aos vários órgãos, é vital. Quando o ritmo da liberação e/ou a quantidade de hormônios são desarranjados, os resultados podem ser devastadores e definitivos.
   Esses efeitos podem ocorrer relacionados a quantidades inapropriadas de produção ou com a desconexão da resposta ao estímulo, bloqueando os efeitos hormonais nos seus pontos de inserção no organismo. Qualquer uma destas interferências no sistema endócrino pode afetar o desenvolvimento físico em geral, do aparelho reprodutivo, do desenvolvimento cerebral, do comportamento, da regulação da temperatura e de muitos outros. 
   Os efeitos disruptores são bastante variáveis. Estes, não atua como os venenos clássicos e nem são carcinogênicos, pois não matam a célula, nem atacam o DNA, e sim interfere na comunicação do corpo, alterando os processos fisiológicos. Em humanos os hormônios atuantes são:
  • Óxido de Etileno- Aborto espontâneo em profissionais que esterilizam instrumentos. 
  •   Atrazina - Redução na qualidade do esperma.
  •  Ascarel (PCB) -Declínio da função do sistema imunológico e aumento de doenças infecciosas ; acumula-se no leite materno; Endometriose; Atravessa a barreira placentária e chega ao feto; crianças nascidas de mães com PCB no sangue têm peso reduzido; Acumula-se nos tecidos do feto.
  • Manganês - Causa danos ao DNA dos linfócitos; Mal de Parkinson; Concentra-se na tireóide, e pâncreas.
   Mas existe alternativa? Alguns estudos vêm sendo desenvolvidos a fim substituir o uso desses agentes químicos, como por exemplo, o método do controle biológico. Veja abaixo o vídeo mostrando como é aplicado esse método.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

   É importante ter um cuidado maior com o despejo de substancias químicas no ambiente. Apesar de ser complicado fazer uma lista com orientações que cubra tudo que é necessário fazer para evitar os disruptores endócrinos. 
   Diante do descaso das instituições publicas em relação aos nossos direitos de cidadãos, precisamos nos auto-educar quanto aos perigos ambientais que invadem nossas vidas de uma forma tão intima. Mesmo já estando cientes sobre este mal invisível, as indústrias continuam querendo nos manter alienados e na ignorância dos danos causados pelos produtos que utilizamos rotineiramente em nossa vida domestica e profissional, que vão desde os produtos de limpeza, tintas e colas, aos de jardinagem e suplementos para animais de estimação além de produtos para automóveis, suprimentos para artes, nos cosméticos e nos alimentos.
 
QUER SABER MAIS? QUE TAL VER O VÍDEO ABAIXO?


REFERÊNCIAS:


GULLAN, P. J.; CRANSTON, P. S; MCINNES, K. Hansen. Os insetos: um resumo de entomologia. 3.ed São Paulo, SP: Roca, 2008. 440 p.

RANDALL, David J.,; BURGGREN, Warren; FRENCH, Kathleen. Eckert fisiologia animal : mecanismos e adaptacoes. 4. ed Rio de Janeiro: Guanabara, 2000. 729 p.

SANTAMARTA, José. A ameaça dos Disruptores Endócrinos. Agroecol.e Desenv.Rur.Sustent.,Porto Alegre, v.2, n.3, jul./set.2001

http: www.inctem.bioqmed.ufrj.br/...resistencia-e-inseticidas. MOREIRA, Mônica Ferreira. MANSUR, Juliana Figueira & MANSUR, Janaina Figueira. Resistência e Inseticidas: Estratégias, Desafios e Perspectivas no Controle de Insetos.


http://hormonio-estudo.blogspot.com.br/

http://apbio82007.blogspot.com.br/2008/02/endocrine-system-hormones.html

http://www.cartage.org.lb/en/themes/sciences/lifescience/generalbiology/physiology/endocrinesystem/MechanismsHormone/MechanismsHormone.htm

http://www.irac-br.org.br/curso02.htm

http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-40422007000300027&script=sci_arttext

Um comentário:

  1. Cuidado. Muitos agrotóxicos com ação de desregulação hormonal também causam câncer.

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